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Economia

Por que Santa Catarina virou o Estado mais procurado por quem muda de região no Brasil

O principal fator é a questão econômica, em que tem toda a dinâmica econômica do Brasil centrada no Centro-Sul do país e os mercados de trabalho.

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Dados do IBGE mostraram que Santa Catarina se tornou o principal destino dos brasileiros que decidem mudar de Estado. Entre 2017 e 2022, o estado recebeu 503.580 migrantes interestaduais, sendo que 134,8 mil (26,8%) foram do Rio Grande do Sul.

A coluna conversou com Lauro Mattei, coordenador do Núcleo de Estudos de Economia Catarinense (Necat) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), sobre o assunto.

Lauro Mattei, coordenador do Núcleo de Estudos de Economia Catarinense (Necat).Ítalo Padilha / Agecom/UFSC

O que é mais importante observarmos nesses números?

É relevante analisarmos de onde vêm essas pessoas. Do Rio Grande do Sul, são 134 mil; do Paraná, 96 mil; e de São Paulo, 62 mil. Somente esses três Estados representam quase 50% dos migrantes, com o RS respondendo por 27%. Mas o que mais chama atenção é algo que, na prática, já sabíamos: esse movimento pendular entre Estados vizinhos — Rio Grande do Sul, Paraná e São Paulo. Quando observamos para onde vão os catarinenses que saem, o destino são os mesmos três Estados. Dos 149 mil que deixaram SC, 76% foram para esses Estados. O que significa isso? As condições de proximidade e de infraestrutura no transporte, permitem esse deslocamento para locais mais próximos, em uma região que é muito conectada em termos econômicos, de atividades produtivas e geração de emprego. O que o estudo, de alguma forma, qualifica é aquilo que era perceptível.

São três pontos: por um lado, a questão econômica, em que tem toda a dinâmica econômica do Brasil centrada no Centro-Sul do país e os mercados de trabalho. Por outro lado, tem a questão de transporte que facilita esse deslocamento. Esses fatores de infraestrutura, essa proximidade geoeconômica é o que chamamos de centro dinâmico da economia do Brasil. Há, ainda, a infraestrutura que existe nesses Estados, seja em termos de habitação, saneamento, energia, educação, saúde, e a facilidade de deslocamento. Você pega um ônibus aqui de final de tarde, no início da manhã você está em São Paulo. Há uma facilidade e um custo bem inferior do deslocamento das pessoas do Nordeste e do Norte do país para vir para as regiões sul do Brasil. Então, é uma conjugada desses fatores que explica isso.

E o que mais atrai migrantes para Santa Catarina?

Acho que são três explicações muito claras: o primeiro é o mercado de trabalho. Em Santa Catarina, tem três condições que são extremamente atrativas para toda a população. Primeiro, é o Estado com mais baixas taxas de desemprego do país. Segundo, tem um alto índice de formalidade das relações de trabalho, ou seja, recebe a vaga de emprego com carteira assinada, com os direitos trabalhistas garantidos. E terceiro, tem o nível de renda média dos empregos mais elevado do país, acima da média.

A combinação desses três fatores, eles exercem uma influência muito grande sobre os migrantes. A segunda explicação é sobre as condições estruturais, na área de serviços ofertados à população. O serviço de saúde, de educação, de transportes, você tem uma infraestrutura bem articulada e ágil em termos de atender, porque as pessoas vão migrar, vão precisar desses serviços complementares. E o terceiro, que eu acho que tem uma característica importante, que tem um acolhimento de pessoas mais idosas, ou seja, de aposentados.

Você vai criando na faixa litorânea de Santa Catarina um conjunto de cidades de aposentados de outros Estados. É o típico da região de Balneário Camboriú, Itapema, Itajaí, essa região toda que tem uma explosão da população. Mas se você vai nesses municípios, é uma população já com um padrão de renda de aposentado, que vai curtir o resto da vida nesses espaços. É um acolhimento de aposentados, de pessoas já com a vida organizada.

Quais as principais regiões de destino dos migrantes?

São fluxos diferentes. Temos um fluxo grande de estrangeiros entre venezuelanos e haitianos, por exemplo, concentrados na região de Concórdia, Chapecó, no setor de agroindústria alimentar. Argentinos, cubanos, paraguaios vêm para o setor de comércio e serviços, que é mais nas áreas litorâneas e na Capital. E no caso dos brasileiros, é uma mescla muito forte.

Você tem, por exemplo, no litoral norte de Santa Catarina e sobretudo na região de Joinville, Jaraguá, São Francisco do Sul, você tem uma expansão bastante grande no setor da indústria, especialmente na indústria de metalmecânica, eletroeletrônica que são, vamos dizer hoje, o motor da economia de SC. Você perdeu o fluxo em direção ao Vale de Itajaí por causa da desestruturação do setor têxtil, que também atraía muito a mão de obra, e agora tem um grande apelo no setor de serviços.

O comércio é mais restrito em algumas cidades polos regionais, como Joinville, Florianópolis, Blumenau e Itajaí. E tem a mão de obra, que é bem sazonal para os períodos típicos de atividades mais intensas, por exemplo, na colheita de maçã, que é em fevereiro, março e abril, nos meses seguintes até o mês de julho a colheita da cebola, que é o Vale Itajaí tem bastante. Em síntese, como você tem uma economia altamente diversificada e regionalizada, as pessoas vão encontrando espaço para se alocar enquanto empregados e a partir daí organizar sua vida com emprego e com renda.

Com certeza é bem maior e tenho isso por alguns contatos que temos aqui em Florianópolis, sobretudo, na prestação de serviços. Uber, entregadores da iFood, pessoas na área de turismo, pessoas oferecendo assessoria, que trabalham com informática. Numa praia do norte da Ilha, por exemplo, conheci vários que vieram para Florianópolis, estão alugando na praia e estão trabalhando em home office.

Que esse é um outro aspecto, o teletrabalho em função da explosão enorme desse setor durante e para frente da pandemia. E Florianópolis, em especial, é um polo tecnológico de grande relevância. São dezenas e dezenas de milhares de pessoas trabalhando nessa área na região. E isso tem uma característica importante que facilita a migração de pessoas qualificadas, porque você pode tranquilamente morar em uma casa, em um apartamento em uma praia onde o custo é bem inferior durante a baixa temporada, e trabalhar de casa.

Como as políticas públicas de SC devem se adaptar?

É muito importante porque certamente esse volume de gente vai imperar sobre as políticas públicas, sobretudo políticas de saúde, educação, atendimento social, de distribuição, programas sociais... O que que isso traz? Traz um conjunto de novas demandas para as políticas públicas, sobretudo na esfera social. Elas têm de ser repensadas, porque causam um impacto muito grande.

Vimos isso no verão, quando tivemos aqui em Florianópolis um certo ciclo de dengue e outras viroses, e aí a explosão em cima do sistema de saúde foi muito grande.

Cabe às autoridades e aos governantes, tanto na esfera municipal como na esfera estadual, repensar e redimensionar as políticas públicas na área social, em particular na área de saúde, educação, assistência e transporte, que por sinal é nos setores muito mais caóticos em Santa Catarina, o transporte urbano. Ele é deficiente em praticamente todas as médias de grandes cidades.

Fonte: Zero Hora


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